Eles prometem energia e o status de descolado em apenas alguns goles. Nos últimos anos, os energéticos vêm ganhando - e não só do ponto de vista positivo - o coração dos mais jovens. Puro ou misturado, eles vendem a ideia de ser uma espécie de “combustível” para práticas esportivas, atividades do dia a dia e uma noitada daquelas. Mas vêm entregando, na verdade, riscos, em especial à saúde cardíaca de seus consumidores.
Atração energética
A promessa de energia vem da mistura de cafeína e taurina (substância de efeito estimulante quase imediato) com açúcares e outros ingredientes. Mas a atração não seria a mesma se não fossem a grande variedade de sabores, as embalagens chamativas e a facilidade de acesso. As estratégias de marketing têm feito tanto sucesso que a bebida passou a ser incluída na geladeira de 38% dos lares brasileiros. Dados divulgados pela Kantar em maio ainda apontam que a tendência também se estendeu fora de casa: 22% dos brasileiros de até 29 anos se tornaram novos compradores do produto - isso aconteceu mesmo diante do aumento do preço do produto e ainda diante de uma redução do consumo alcoólico brasileiro nos últimos anos..
Combo noitada
No Brasil, os energéticos são regulamentados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que determina que os rótulos tenham a quantidade de ingredientes dentro dos limites permitidos e traz uma orientação muito clara: “não é recomendado o consumo com bebida alcoólica”. Em bares e festas, é possível notar que a recomendação é frequentemente ignorada. Drinks com energéticos misturados com as mais diversas bebidas alcoólicas são inclusive exibidos e oferecidos em cardápios sem melindre algum.
Outra recomendação da Anvisa que passa batida é a seguinte: “crianças, gestantes, nutrizes, idosos e portadores de enfermidades devem consultar o médico antes de consumir o produto”. Acontece que já há até energético para crianças. Uma das marcas desse mercado diz revolucionar o setor ao oferecer um produto específico para o público infantil. Sem taurina e cafeína, e com o personagem Sonic estampado na lata, o tal energético infantil promete atuar na saúde cognitiva com uma seleção de vitaminas e sais minerais.
Levando corações
No início do ano, um caso repercutiu e serviu de alerta para os usuários. O ator Rafael Zulu contou em suas redes sociais o susto que levou após o consumo excessivo de bebidas energéticas durante uma festa em família: precisou ser encaminhado ao hospital com o risco de sofrer um ataque cardíaco. Ele teve um quadro de fibrilação atrial, que o deixou com a respiração ofegante e o coração acelerado.
Médico cardiologista, Maurício Nunes cita que esse é apenas um dos quadros que podem ser ocasionados pelo consumo em excesso da bebida, especialmente no sistema nervoso e cardiovascular. “Tudo em excesso faz mal. As bebidas energéticas podem provocar palpitações, aumento da frequência cardíaca, arritmias, aumento da pressão arterial e, em casos extremos, poderá também acontecer uma lesão no coração chamada infarto do miocárdio”, afirma o especialista.
Para treinar com saúde
Com as propagandas relacionando o produto a hábitos de vida saudável e personalidades do esporte, os jovens logo encontraram uma outra atribuição ao consumo de energéticos: aumentar a performance no treino e nas atividades físicas. Com a presença da cafeína, o produto passou a ser utilizado como “pré-treino".
A advogada Ana Beatriz Santana, de 28 anos, foi uma das que aderiu a esse tipo de consumo. Ela conta que só conseguia ir à academia se bebesse um energético. Aos poucos foi aumentando seu consumo até que sofreu um mal estar: coração acelerado, suor frio, enjoo, visão escurecida e a sensação de desmaio foram alguns dos sintomas dela. “Tudo foi acontecendo de forma bem gradual, fui aumentando aos poucos, até começar a tomar todo dia, quase como uma droga”, relatou a advogada.
Apenas com uma lata para ir para academia, Ana Beatriz já consumia de cafeína o equivalente a 90 ml de um café expresso, isso sem incluir os quase 40g de açúcar. O caso de Ana Beatriz, do ator Rafael Zulu e tantos destacam a importância de um debate que deve ir além do rótulo e alcançar escolas, lares e espaços de lazer.
Na Inglaterra e na Escócia, por exemplo, a discussão chegou a uma consulta pública sobre o fim da venda para crianças há quatro anos. O Reino Unido também avalia a possibilidade, enquanto países como Letônia e Lituânia já proibiram.