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Lei que prevê carteira de identificação para autistas ainda não foi regulamentada na Bahia


Lei que prevê carteira de identificação para autistas ainda não foi regulamentada na Bahia

No dia 9 de janeiro de 2020, o presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, a Lei Romeo Mion, que criou a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea). Um dos trechos da norma retirado pelo Chefe do Executivo brasileiro foi o que dava prazo de 180 dias para a regulamentação em estados e municípios. Sexta-feira, dia 2 de abril de 2021, Dia Mundial de Conscientização do Autismo, e a Bahia ainda não tem a regulamentação dessa lei.

 

Com o nome em homenagem ao filho do apresentador de televisão Marcos Mion, que possui transtorno de espectro autista (TEA), a norma prevê que a Ciptea assegure aos portadores "atenção integral, pronto atendimento e prioridade no atendimento e no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas de saúde, educação e assistência social".

 

Na visão do vice-presidente da Associação de Amigos do Autista da Bahia (AMA-BA), Leonardo Martinez, a implantação da carteira no estado é fundamental. "O autismo é uma deficiência que não tem características físicas. Desde 2012 foi definido como deficiência. Para as pessoas poderem exercer seus direitos, como não tem característica física, se torna mais difícil. A partir da carteira, se torna mais fácil, e evita o preconceito de quem não consegue entender quando aquela pessoa precisa de prioridade na fila, assento no ônibus. Além de outras questões. Banco de dados, informações, características públicas, etc.", afirmou, em entrevista ao Bahia Notícias.

 

Apenas alguns estados, como Paraná, Ceará, Pará e Piauí, além do Distrito Federal, já possuem a regulamentação. No Maranhão, por exemplo, a identificação é feita a partir da própria Carteira de Identidade. "O RG daqui tem que conter todas as informações. Tanto autismo, como CNH, tipo sanguíneo, etc. A identificação resguarda os direitos dos autistas, ajuda até mesmo em uma abordagem policial. Por se tratar de uma síndrome permanente, e que não tem cura, muitas pessoas não tem noção devido ao comportamento diferenciado que o autista tem. Ter a identificação é melhor do que andar com um laudo", relata Alana Sampaio, 29, que mora na capital maranhense, São Luiz. Ela é mãe de Allan, 7, que tem TEA.

 

Leonardo Martinez alega que enviou ofícios para a Secretaria de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer (Sempre), de Salvador, e para a Secretaria de Segurança Pública (SSP) da Bahia para tentar agilizar a regulamentação da Lei Romeo Mion. Segundo ele, contudo, até o momento não houve retorno. O Bahia Notícias tentou contato com os órgãos. A SSP afirmou que iria verificar a solicitação. A Sempre não deu retorno até o fechamento da matéria.

 

CONTRAPARTIDA

Como Bolsonaro vetou o dispositivo que previa a regulamentação em 180 dias, alegando que “viola o princípio da separação dos poderes”, a implementação ficou a critério de estados e municípios. Titular da Superintendência dos Direitos da Pessoa com Deficiência - vinculada à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social -, Alexandre Baroni justifica que a identificação de pessoas autistas é um assunto delicado.

 

"Eu falo porque sou uma pessoa com deficiência, sou usuário de cadeira de rodas. Quando você coloca em um documento, essa situação tem dois lados. O lado positivo é que você pode ter algum tipo de benefício. Por outro lado, você passa a receber uma tarja, um carimbo que é uma coisa que, na nossa opinião, é negativa. Eu não quero ser visto pela minha suposta deficiência. Mas eu quero ser incluído na sociedade, ter uma sociedade acessível e inclusiva. Até teve uma família de autista que me disse assim 'agora eu preciso colocar um crachá no meu peito que eu sou autista para as pessoas saberem da minha situação?'", pondera. 

 

Esse outro lado também foi lembrado por Lidiane Ramos, mãe de Kauã, 8, que também tem autismo. "Existem três vertentes. As famílias que super apoiam, super adoram, as famílias que não adoram, e aquelas que não querem nem pensar em falar, por causa dos rótulos e do grau. Cada grau de autismo é diferente. Para aquelas crianças, jovens, adolescentes e adultos que têm uma comorbidade mais séria, que não têm muita paciência de ficar em fila, que realmente precisa da questão da prioridade, é bacana. Para o caso de Kauã, é e não é bacana. Eu faria a identidade dele, mas não sei se usaria ela de uma forma tão expressiva quanto eu usaria a identidade normal. Acho que eu teria as duas identidades na mão. Quando eu julgasse oportuno, eu usaria sim", revela. 

 

RELATOS

Lidiane aproveitou para contar dificuldades que já teve de enfrentar por causa da dificuldade que outras pessoas têm para identificar o autismo. "Na fila de um supermercado, uma moça me abordou e disse: 'essa fila é especial'. Eu disse 'eu sei'. Ela me perguntou: 'você é idosa, está grávida?'. Respirei fundo, e disse pra ela: 'não, meu filho é autista'. Ela me pediu mil desculpas e saiu para fumar. Quando voltou, disse que tinha uma sobrinha neta que também é autista a gente acaba julgando. Talvez em outro momento eu tivesse dado outra resposta e tivesse me feito muito mal. Me fez mal? Fez. Mas não me fez tão mal como me faria em outras épocas", conta. 

Kauã, 8, nasceu com Transtorno do Espectro Autista e é torcedor do Bahia | Foto: Acervo pessoal

 

Atualmente, na Bahia, a única forma de comprovar o Transtorno do Espectro Autista é com o laudo que mostra o diagnóstico médico. Porém, Leonardo Martinez revelou à reportagem que muitas famílias de autistas passam por "perrengues" com isso. Nem sempre quem faz o monitoramento da prioridade em estabelecimentos o aceita.

 

O advogado Romeu Sá Barreto, que estuda os direitos do autista e é coautor de dois livros sobre o tema, que serão lançados em junho de 2021, alega que, apesar de não "oficial", o laudo deve ser aceito. "Os funcionários que arguiram essa não oficialidade desconhecem a soberania da prescrição médica", afirma.

 

Quanto à regulamentação, ele afirma que nenhuma ação judicial pode obrigar o estado e o município a implantar a medida. Porém, "pressão popular e petições públicas poderão ajudar".

 

CONSCIENTIZAÇÃO

O Dia Mundial de Conscientização do Autismo, celebrado nesta sexta-feira (2), foi criado pela Organização das Nações Unidas em 18 de dezembro de 2007. Na Bahia, a AMA-BA atende, de forma fixa, 250 famílias que possuem pessoas com o transtorno. "Estamos na expectativa da construção da sede própria. Vai auxiliar no atendimento. Foi uma promessa de campanha do prefeito Bruno Reis. Esperamos para 2021. Vai ampliar nossa capacidade de 250 famílias para 800 famílias, e em torno de 3 mil atendimentos mensais", revela Leonardo Martinez.


por Rebeca Menezes / Nuno Krause

 

No contexto da pandemia do novo coronavírus, o vice-presidente do órgão ressalta a importância de estabelecer pessoas autistas como grupo de risco da Covid-19. "Tem maior facilidade de se contaminar, pois muitos deles não têm noção do risco. Tem questões sensoriais também. Eles levam muito a mão à boca, aos olhos. E além de ser grupo de risco, possui dificuldade maior no tratamento da recuperação. Uma pessoa neurotípica, que não tem autismo, se ela se contamina e vai evoluindo o tratamento. A pessoa com autismo, por não ter o entendimento dessa situação, muitas vezes precisa ser de imediato sedada", conta. 

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